(tréplica
ao poema de Rita Apoena, resposta ao poema “Apelo”, de Dalton Trevisan)
Senhora,
sua ausência não se faz sentir apenas nas coisas que estão desorganizadas em
nossa casa. Na verdade, nosso lar é o retrato mais fiel de como está meu
coração desde que você partiu.
Os meus sentimentos estão em frangalhos, já não sei o que pensar, por onde andar, em que depositar minha esperança. Pior é imaginar que a sua partida foi porque não soube ouvir e tampouco valorizar quem esteve ao meu lado por tanto tempo.
Antes de perder você, Senhora, eu não era capaz nem de escutar a mim mesmo, que dirá estar atento às suas necessidades. Embora tenha demorado muito para me dar conta da sua falta, a saudade aflorou em mim sentimentos tão intensos como nunca antes experimentara em minha vida.
Esses 30 dias me ensinaram mais do que 30 anos. Fique certa de que o maior problema da nossa separação não é a bagunça que ficou a nossa casa sem a Senhora. Se esta fosse a questão, já teria contratado uma empregada. Quer dizer, uma diarista, porque os encargos trabalhistas de uma doméstica ficaram muito caros...
Falei do
leite coalhado, da pilha de jornais, do canário mudo, das violetas murchas, da
camisa sem botão, da meia furada e do saca-rolhas porque essas pequenas coisas,
Senhora, teimavam em revelar a grandeza do que eu havia perdido. Para que
bancar o forte, se fico bem mais próximo da felicidade ao ser um “babão
apaixonado”? Quando disse que aprendi muito neste um mês de separação eu não
estava mentindo: até aprendi a ser romântico.
Volta para
casa, Senhora. Prometo não brigar mais pelo sal no tomate, regar as violetas,
recolher o jornal debaixo da escada e fazer um curso de corte e costura para
fazer pequenos reparos em minhas roupas.
Um
jantar à luz de velas regado a um vinho do Porto estará à sua espera. Afinal de
contas, encontrei o saca-rolhas e quero comemorar esta descoberta com a
redescoberta do amor que um dia a Senhora já teve por mim.
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