Nunca se falou tanto dos filmes da série “De
volta para o futuro” como nesta semana. Se a ficção científica fosse
verdadeira, Marty McFly teria aparecido com o Delorean nesta quarta-feira, 21
de outubro de 2015.
Muito se comparou a respeito das tecnologias
que o filme apresentou com aquilo que realmente se confirmou. Skates voadores e
videoconferências à parte, é pertinente avaliar como o mundo mudou desde 1985, quando
o segundo filme da série.
Nos últimos 30 anos a ciência evoluiu muito,
sem dúvida. Mas, o que o ser humano tem feito com toda essa tecnologia?
A Guerra Fria acabou, mas o terrorismo continua
causando o mesmo temor que as ogivas nucleares norte-americanas e soviéticas. A
internet fez o mundo transpor barreiras muito maiores que o Muro de Berlim.
Na esteira de Margareth Thatcher, então
primeira-ministra da Inglaterra, as mulheres ganharam espaço no mercado de
trabalho e no gabinete das maiores nações e empresas do mundo. Entretanto,
continuam – não importa avaliar por culpa de quem – sendo subjugadas pelo
machismo mundo afora.
As crianças da década de 80, que sonhavam com
uma autorização dos pais para poder ficar assistindo à TV até mais tarde, já
não existem mais. Hoje elas já nascem sabendo lidar com recursos muito mais modernos
do que aquela geringonça que ainda nem tinha controle remoto. O que não mudou
foi a indiferença dos adultos que sempre as colocam como a ponta mais fraca
dessa corda.
Minorias como homossexuais, imigrantes, negros,
indígenas e muitas outras continuam sendo alvos de perseguições quase sempre
injustificadas. Quanto aos idosos, poucas mudanças também...
A exemplo do Doctor Brown, eles sonham com a
invenção (de verdade) de uma máquina do tempo que os leve de volta à juventude,
livres das limitações do preconceito e do corpo. Mas desejam fazê-lo com a
maturidade que têm hoje, evitando os erros que cometeram ao longo de uma vida.
A verdade, porém, é uma só: é “quebrando a
cara” que se aprende a fazer do jeito certo. E como o personagem interpretado
por Cristopher Lloyd alerta em vários momentos da trilogia “De Volta para o
Futuro”, mudar alguma coisa no passado pode ser altamente perigoso, pois
desencadeia reações em cadeia que acabam fugindo do controle.
Longe de mim discutir com Doc Brown, mas essa advertência
esconde o medo inconsciente que o ser humano tem do tempo: o passado que causa
arrependimento, o presente de decisões difíceis e o futuro com incertezas –
misturar tudo isso dá uma confusão enorme. E sabe a que conclusão chego: que a
mediocridade ainda impera na humanidade tanto quanto há 30 anos, seja por
comodismo ou por interesse dos poderosos em deixar as coisas como estão.
Congrego da mesma opinião do meu amigo
cartunista Maycon Catelli. Além de não ter visto nada daquilo que estava no
roteiro, McFly, se realmente tivesse dado as caras por aqui nesta semana, teria
encontrado um mundo diferente, mas não melhor.
Ok, em 1985 eu não era nascido, mas percebo que
ainda existem muitas negligências acontecendo naquilo que é mais básico ao ser
humano. As redes sociais possibilitam contato com milhares de pessoas, mas nada
que supra a presença real dos amigos de verdade e da família, instituição cada
vez mais fragilizada.
Falta alguma coisa para se apegar, como a tão
controversa fosfoetanolamina para as pessoas que estão com câncer e, a julgar
pela importância que o Ministério da Saúde dá à substância, mais parece ser uma
fórmula de uma tia benzedeira do bairro. Sobram contradições, como a dos
policiais militares de São Paulo, que estão à serviço da população e do estrito
cumprimento da Lei, aplaudindo um colega sendo levado pela Polícia Civil para a
prisão por causa de torturas cometidas por ele contra um suspeito de roubo até
ele confessar um crime – e em se tratando de tortura, não importa se o
indivíduo é ou não culpado uma vez que este não é obrigado a produzir provas
contra si, sendo esta uma responsabilidade do Estado.
Acreditar em algo que a ciência não deu a
palavra final ou, por meio de um ponto de vista parcial, conferir o status de
herói a quem cometeu um crime mostra como o ser humano precisa melhorar. Tão
importante como inventar máquinas que oferecem conforto, rapidez e praticidade
(ou talvez alguma que faça viajar no tempo) é adotarmos práticas que concorram
para a nossa felicidade.
O Delorean do Doctor Brown saiu de cena ainda
na década de 80, mas o nosso desejo em ser melhores deve sempre estar na tela
da nossa vida...